Teoria dos Jogos
- concursosmpraiz
- 8 de ago. de 2019
- 4 min de leitura
Teoria dos Jogos aplicada ao Direito
O objetivo do presente texto é desenvolver algumas noções básicas sobre a Teoria dos Jogos aplicada ao Direito, baseada no curso “Análise Econômica do Direito”, ministrado pelo Procurador da República André Bueno da Silveira.
Para contextualizar o tema, importante estabelecer a premissa de que a Análise Econômica do Direito é um método de elaboração, interpretação e aplicação do Direito com uma tendência mais consequencialista e pragmática. Tem como objeto as respostas racionais dadas pelas pessoas aos incentivos gerados pelo ordenamento jurídico.
A Teoria dos Jogos, inserida na Análise Econômica do Direito, leva em consideração que o direito, frequentemente, tem que lidar com situações em que há poucos tomadores de decisão e que a ação ideal a ser tomada por uma pessoa, depende do que o outro ator escolhe.
Um dos exemplos da aplicação da Teoria dos Jogos é o dilema dos prisioneiros. Hipoteticamente tem-se uma situação em que são colocados dois prisioneiros, separadamente, e fornecidas duas opções:
Confessar --> neste raciocínio, o confessar significa trapacear, violar as regras.
Ficar em silêncio --> significa cooperar.
Assim, forma-se o seguinte cenário, com informações completas, mas imperfeitas:
A e B em silêncio --> vão ter de cumprir seis meses de cadeia
A confessa e B fica em silêncio --> A sai livre e B cumpre 10 anos de cadeia
B confessa e A fica em silêncio --> B sai livre e A cumpre 10 anos de cadeia
A e B confessarem --> ambos cumprem 5 anos de cadeia

Perceba que duas pessoas precisam tomar uma decisão, de forma isolada. Se elas trapacearem, elas ganham um benefício, mas só se a outra cooperar. Porque se as duas escolherem trapacear, a situação é pior do que as duas cooperarem.
Ao trazer este raciocínio para o Direito Penal, percebe-se que a delação premiada é fortemente relacionada com o dilema dos prisioneiros, em razão da estratégia a ser adotada pelo investigado/réu, pois há o risco do coautor realizar a colaboração por primeiro. Neste contexto, é extremamente importante a possibilidade de prisão depois da condenação em segunda instância, porque aumenta o risco da pessoa se ela não colaborar. Se existe o sentimento de punição, há uma influência na estratégia dominante do âmbito do dilema dos prisioneiros.
Outro conceito essencial da Teoria dos Jogos é a tragédia dos comuns, agora analisando o âmbito coletivo, com vários jogadores e um bem coletivo. Neste caso, a ação de uma pessoa, de forma independente e racional, visando seus próprios interesses (que aqui seria a estratégia dominante), comporta-se contrariamente aos interesses da comunidade, esgotando-se o recurso comum e prejudicando a todos. É facilmente perceptível a sua aplicação no Direito Ambiental.
Por outro lado, às vezes uma análise puramente deontológica (dever ser), buscando um determinado objetivo pode gerar como consequência exatamente o oposto: prejudicar o objetivo que se busca. Sob a perspectiva da Análise Econômica do Direito, foi o que aconteceu com o acesso ao Judiciário, conforme bem desenvolvido por Ivo Teixeira Gico Júnior, no texto intitulado “A tragédia do Judiciário”.
O Judiciário pode ser visto como um recurso e a prestação jurisdicional é um fruto deste recurso, porque a sentença ou o acordão advém do Judiciário, mas o seu uso e gozo, não diminui o principal. Ademais, o Judiciário é um recurso comum de livre acesso. É comum porque ele não é excludente, ao contrário, é inclusivo.
Por outro lado, o Judiciário é um recurso escasso rival. Isto porque, quanto mais é usado, mais difícil é que os outros o usem. A título de exemplo, enquanto o juiz faz uma sentença, faz uma audiência, ele deixa de fazer a mesma coisa para outro caso.
No entanto, quando um litigante individual decide levar o seu caso para os tribunais, considera apenas o seu custo e benefício privado, individual. O agente não computa o custo social do seu litígio, incluindo o tempo que outras ações, mais ou menos importantes, mais ou menos meritórias, terão de aguardar para que o caso dele seja julgado. O litigante tem incentivo para acionar o Judiciário enquanto seu benefício individual esperado for maior que o seu custo individual. A sua contribuição individual para o congestionamento é substancialmente externalizável.
Qual é a consequência? E qual é a solução?
No Brasil, foram tomadas medidas focadas no acesso ao recurso – Judiciário, como por exemplo, a expansão dos Juizados Especiais, quando o correto seria focar na possibilidade de usar e gozar do fruto, que é a prestação jurisdicional, que é o que as pessoas desejam.
Consequências para o acesso à justiça são: baixos custos de litigar, conjugados ao problema da insegurança jurídica. Isto gera um incentivo para que as partes litiguem excessivamente.
Há um problema de Sobreutilização do Judiciário, demandando serviços públicos adjudicatórios em busca da tutela jurisdicional acima da capacidade instalada do Judiciário. Tal fato, aumenta ainda mais a lentidão, que é um problema conhecido há décadas do Judiciário.
A solução poderia ser investir em mais juízes, mais servidores, mais estrutura. No entanto, existem dados empíricos que demonstram que isso não é a resposta mais eficiente. Além disso, este tipo de investimento, tende apenas a incentivar igualmente a sobreutilização do Judiciário e, consequentemente, a morosidade.
O agravamento da tragédia do Judiciário gera uma “seleção adversa”. Ou seja, ele transforma o Judiciário em um mecanismo de burla ao Direito, porque um grupo marginal de usuário potenciais deixa de usá-lo. Além disso, a morosidade incentiva o seu uso por quem não tem direito, por exemplo, para postergar o pagamento à alguém que tem direito.
Então a solução é o investimento em segurança jurídica, que é o que pode ser considerado capital jurídico. A insegurança jurídica tem um valor enorme para quem não tem direito, e prejudica significativamente quem tem direito.
A segurança jurídica também leva a uma diminuição da morosidade. Se há segurança jurídica, as partes sabem, com alta probabilidade, que o resultado de uma ação vai ser X, e se uma empresa sabe que uma causa tem o valor 10 vai virar 100, e não que cada magistrado vai decidir de uma determinada forma, isso tende a aumentar o número de acordos, diminuir o índice de litigância e, por consequência, diminuir a morosidade.
Então sob a ótica da Análise Econômica do Direito, a uniformização da jurisprudência e o consequente fortalecimento da segurança jurídica são mais eficientes para garantir o acesso universal à Justiça que a própria criação de Juizados Especiais, por exemplo.
Em resumo, a Teoria dos Jogos lida com qualquer situação em que a estratégia é importante e melhora a compreensão das regras e das instituições jurídicas.
Ro
“Você falha, entende o que houve, aprende, tenda novamente, não desiste, até conseguir....” Rogério Sanches Cunha
Muito obrigada pela iniciativa!
Muito bom, para acrescentar ainda mais ao tema, recentemente ouvi o podcast "Salvo Melhor Juízo" (Episódio 84) no qual o entrevistado era o professor Alexandre Morais da Rosa que possui uma obra específica sobre o tema. Vale a pena conferir.